Entrada franca!

Entre...pode entrar!!!! Vasculhe tudo!!!!! Se pelo menos durante alguns segundos você parar em algum texto para tentar compreender algo, tentar desvendar o campo semântico de alguma palavra ou até mesmo se emocionar...terei cumprido o meu papel.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Currículo

O senhor tem Curriculum Vitae?

_ Ocê tá falando estrangero?

Bom...esquece...algumas perguntas...

Estado civil?

_ Maranhão

Casado, solteiro, viúvo, divorciado...

_ ...sô não senhora...nóis juntamo mermo...

Nacionalidade?

_ Qual que é a próxima pregunta?

Filhos?

_ Os vivo é 3...os morto...eita...que inté se esqueci...

Filiação?

_ Só os do vivo tá bão? Ostinho...Creiton...Maria.

Idade?

_ 33

Religião?

_ Vixe que quem protege eu é Santo Expedito...

Endereço?

_ Beco da esperança s/n  lote 666

Bairro?

_ Só mandá que chega...rsrsrsrs

Grau de instrução?

_ ...

O senhor já estudou, frequentou escola?

_ Eita que já levantei várias que só ocê vendo mermo...rsrsrsrsrs

Sexo?

_ Que que isso, moça!!!! Que eu vim cá pra intrevista...e...

O senhor é do sexo masculino ou feminino?

_ Eita que ocê num tá vendo não...sô macho...

CPF e identidade?

_ 33...num já disse...

Vale transporte?

_ 3 de ida e 3 de vorta

Endereço eletrônico?

_ Hã! Só trabaei inté hoje com as construção.

Telefone para contato?

_ Tá sem crédito...serve?


Por gentileza,  peço que o senhor aguarde contato em sua residência. Próximo!!!!!

Ei, Senhor? Seu nome, por favor?

_ Brasil.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Dia bom

     Gostava da fumaça que subia e do aroma. Saboreava primeiro com o olfato. Um ritual diário que cumpria sempre ao pôr-do-sol. Para ela, uma maneira poética de dar adeus a mais um dia. Toda ela era pura poesia. Parnasiana. Seu corpo, seu cheiro, suas roupas, seu acordar para a vida todas as manhãs. Olhava-se no espelho e dizia: _ Dia bom! Sentia-se bem durante o dia, principalmente se estivesse nublado com nuvens brincando de Salvador Dalí. Lembrava-se dos seus sonhos. Durante alguns minutos mexia com gestos de um pintor meticuloso o café na xícara. Ficava encantada com o movimento. Depois de frio, num gole só degustava o sabor amargo. Não possuia afeição por  açúcar. O natural era, para ela, uma maneira de respeitar a Deus. Foi criada por uma família cristã e, apesar de nunca ter sido, procurava respeitar tudo o que foi ensinado. Pensava sempre no poder do homem de transformar tudo e a todos e essa era uma maneira de dizer não. Eles sempre invadiam os seus sonhos. Aliás, ele sempre invadia o seu sonho.
     Comprava todos os dias um livro. Escolhia pela capa. Mesmo quando percebia que não era tão interessante a expectativa da próxima página o tornava. Era o seu modo de adormecer. O ritual de ir para a cama, apagar as luzes e cerrar os olhos incomodava. Sentava-se numa poltrona, que ficava de costas para a rua, acendia a luz de um pequeno abajour, pegava uma xícara de café e sua viagem iniciava.
     Chegou à Igreja atrasada cumprindo o protocolo de toda noiva. Ansiedade, naquele momento, o seu nome. Perfeito! Pensou assim que avistou o noivo já no altar. Todos os lugares ocupados. Pessoas em pé. Flores. O padre. Ah! E o canto gregoriano anunciando sua entrada. E para não fugir da regra, o friozinho na barriga. Ensaiou um choro, mas se lembrou da maquiagem. As fotos ficariam ruins. O vestido apertado sufocava um pouco, mas nada tiraria seu meio sorriso. Na verdade, queria era arrancar tudo aquilo, pegar seu noivo e sair correndo pelo mundo afora. Todavia, faltava tão pouco. Tudo já ia terminar. Pensava logo em mergulhar no mar verde dos olhos dele e se afogar. Vestiu a face com o véu e foi em direção à felicidade. Tampava um pouco sua visão aquilo. Apenas vultos na retina. Nada importava. Já ia tudo terminar. Sozinha dava passos largos pelo imenso tapete vermelho. Ficou parada à espera de uma mão levantado o véu. Transpirava. Era o seu momento...único e seu. Não quis mais esperar. Esfregou os olhos. Novamente...novamente...novamente...até que um vento muito forte arrancou o telhado da Igreja e algo que parecia com neve começou a cair sobre seu corpo. Desesperada, olhou ao redor. Noivo, padre, flores...nada e ninguém. O tapete...o lindo tapete que a conduziu até o altar se transformou num mar de sangue e uma imensa onda em sua direção banhou seu corpo. Abriu os olhos e sorriu. Acordava assim todos os dias. Não se importava. Sabia que mais um dia, de muito trabalho esperava por ela.
     Caminhava sempre pela rua beirando a calçada. Era o seu modo de arriscar, desafiar e brincar um pouco com a vida. Assim que virou a terceira rua à esquerda, mirou ao longe uma aglomeração. Sentiu uma leve dor. Algo parecido quando estava naqueles dias. Estranhou. Aquela sensação se perdeu há um bom tempo. Continuou. Apertou o passo. Percebeu que algumas pessoas olhavam-na. Ficou inquieta. E quanto mais se aproximava mais gente passava a observá-la como que a reconhecendo. Quando chegou bem perto todas aquelas pessoas ficaram de frente pra ela e foram abrindo caminho. Olhou o chão. Um caminho vermelho que seguiu com passos leves e curtos. Passou a não mais encarar ninguém. Sentia apenas aqueles olhares. Seu foco...o chão vermelho. O último par, um homem e uma mulher, no meio daquela multidão, abriu passagem. Não teve dúvidas. Aliás, nunca teve tanta certeza. Um homem branco, de braços abertos, olhos de mar apontando o céu. O céu. Era seu desejo maior. Ir ao céu como seu homem. Era ele. É ele, pensou. Tirou o sapato. Não podia chegar ao céu sem primeiro se desnudar. Deitou-se ao lado dele. Beijou sua face. Tocou seu rosto. Uma lágrima brotou dos olhos dela e caiu direto nos lábios dele. O primeiro beijo disfarçado. Afinal, muita gente perto. Sorriu. Olhou o céu. O dia nublado e com nuvens. Sorriu novamente. Olhou em redor. Ninguém mais. Apenas um pedaço de tecido branco. Sempre foi muito friorenta. Cobriu-se. Sabia que ele não gostava de cobertas. Mais um sorriso. Pela primeira vez adormeceria deitada.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Indigente

Nunca fui de sentir ódio
Nunca me afeiçoei a ele
Nunca semente
Aliás, nem criação

Ódio é vida
É manter viva a chama
É saudade
Vaidade
Muitas vezes frustração
Lembrança doída
Câncer generalizado
Amputação
Presença ausente
Brasa
Inverno no verão
Outono na primavera
Gaiola sem pássaro
Limbo
Circo
H2O

Não...
Ódio não...
Antes...
...eu mato.

Indigente.